Senado tem ferramenta para estimular participação popular

Qualquer cidadão pode encaminhar uma ideia. Mais de 18,4 mil ideias já foram encaminhadas, tratando DE temas como aborto, maconha, monarquia e porte de armas

Desde 2012, o Senado Federal possui uma ferramenta para estimular a participação popular no processo legislativo. O Portal e-Cidadania possui três ferramentas onde é possível opinar a respeito das proposições que estão tramitando na Casa, acompanhar os eventos realizados ou enviar uma sugestão que pode virar um projeto de lei.

Para tramitar como uma sugestão legislativa (SUG), é necessário o apoio de 20 mil usuários em até quatro meses. Daí a ideia é encaminhada para a Comissão de Direitos Humanos e Participação Legislativa (CDH) e um senador é escolhido para apresentar um relatório, acatando ou não a proposta.

Equipe é responsável por receber a participação popular e moderar de acordo com os termos de uso do Programa e-Cidadania.

Desde o início do programa, 18.445 ideias legislativas foram cadastradas no portal por 13.127 cidadãos diferentes. A maioria delas não conseguiu apoio suficiente (10.909). Mais de 2,5 mil foram arquivadas por ferir os termos de uso, que proíbe declarações de cunho pornográfico, pedófilo, racista, violento, ofensivo ou que firam as cláusulas pétreas da Constituição.

“Já recebemos propostas favoráveis à volta da ditadura, uma proposta para garantir o direito do marido traído de agredir a mulher, muitas para instituição de pena de morte e prisão perpétua, que claramente ferem a Constituição”, conta o coordenador do programa, Alisson Queiroz. “Recebemos todo tipo de ideia. Uma proposta curiosa queria criminalizar os chemtrails (rastros deixados por aviões no céu) porque o autor acreditava que aquilo é uma forma de contaminar o ar”.

Atualmente, 4.962 ainda estão buscando apoio e 27 ideias legislativas já foram encaminhadas para a CDH, das quais cinco já receberam um parecer.

Uma delas, que proíbe o corte ou a diminuição da velocidade da banda larga fixa, foi transformada em projeto de lei (PLS nº100/2017) e está tramitando na Comissão de Transparência, Governança, Fiscalização e Controle e Defesa do Consumidor (CTFC). Outra foi rejeitada pela comissão, mas encaminhada para a Presidência da República por se tratar de assunto de competência do Poder Executivo.

Campeã de votos

A ideia mais votada no Portal e-Cidadania foi proposta por um estudante de ensino médio de 18 anos. Kenji Kikuchi comparou os impostos sobre games do Brasil e dos Estados Unidos e propôs a redução dos atuais 72% para 9%. Após uma postagem no site Reddit, a ideia conseguiu os 20 mil apoios em menos de 24 horas. Conseguiu divulgação espontânea de youtubers e encerrou os quatro meses com 74.299 apoiadores.

“Criaram uma lei nos anos 1980 e taxaram videogame da época como jogos de azar. Mas com o passar do tempo, os videogames se transformaram em consoles (aparelho portátil dedicado a executar jogos virtuais) e não é necessário inserir uma moeda para jogar, mas continuam a tributar como jogos de azar”, explica Kenji.

Mais de 18,4 mil propostas foram encaminhadas ao portal, mas a maioria não consegue a quantidade de votos necessária

Após virar projeto de lei (SUG nº 15/2017), a proposta foi aberta para consulta pública e recebeu 147 mil votos favoráveis, contra 408 contrários. Kenji formou um grupo de trabalho com interessados no assunto e desenvolveu uma pesquisa ampla sobre o mercado de jogos eletrônicos no Brasil, fundamentando sua proposta.

Segundo o documento, o Brasil possui a terceira maior base de usuários online do mundo e a 12ª na geração de receitas. Os jogadores representam cerca de 23% da população e 61% deles compram ou já compraram algum tipo de produto dentro dos jogos eletrônicos, resultando em uma média de US$ 43,54 gastos por jogador, ou seja, um impacto de US$ 1.274 milhões no mercado brasileiro.

“Antes do programa, para conseguir discutir qualquer tema, haveria uma burocracia gigante. A maioria das pessoas não tem contato com políticos. O e-Cidadania é um exemplo de como a democracia deve ser: interação entre o povo e o governo”, afirma Kenji, que complementa: “Sem a ferramenta, não estaríamos debatendo o tema. Pouquíssimos senadores se interessam pelo mercado dos videogames, apesar dele já ser maior que o mercado do cinema”.

Monarquia no Brasil

Mais de 60 ideias legislativas estão relacionadas com a volta da monarquia no Brasil. Uma delas, de autoria do médico Rodrigo Dias, administrador da página Liga Azul Monarquista, conseguiu 28.524 apoios e irá tramitar na CDH.

Rodrigo explica que integra um movimento em conjunto com administradores de outras 25 páginas que desejam a realização de um referendo para a mudança da forma de governo do Brasil, de uma república presidencialista para uma monarquia parlamentarista.

“A monarquia parlamentarista tem a característica de separar o que é governo, a parte transitória vinculada a eleições e partidos, e o que é estado, a parte permanente ligada ao povo”, explica Rodrigo. “Assim, não temos um parlamento tão solto como temos agora, extremamente impopular, afundado em corrupção, onde o povo não tem mecanismo legal para retirá-lo”.

Caso a monarquia seja restaurada no país, o príncipe Dom Luiz de Orleans e Bragança, bisneto da Princesa Isabel e trineto de Dom Pedro II, assumiria a Casa Imperial.

“Eu acredito que temos muitas chances que essa proposta seja discutida. A falência da República está mostrando que as pessoas estão buscando novas alternativas. Somos a quinta ideia legislativa mais votada, mesmo com uma divulgação muito simples”, afirma.

Qualquer cidadão pode se cadastrar no portal e enviar comentários, votar nos projetos de lei ou propor uma ideia legislativa

Questionado sobre a aceitação da população, Rodrigo cita algumas enquetes feitas pelas jornalistas Joice Hasselmann e Mariana Godoy e pelo jornal Financial Times, através do Twitter, questionando a melhor forma de governo para o país. Em todas, a monarquia venceu.

“É fato que majoritariamente a população entende que a república presidencialista no Brasil não deu certo e é marcada por períodos de instabilidade, golpes e ditaduras”, argumenta Rodrigo. “Por defender a participação popular, eu sou monarquista. Entre os dez países mais democráticos do mundo, sete são monarquias parlamentaristas. São países que convocam a população para eleições antecipadas em casos de instabilidade”.

Aborto e maconha

O pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) André Kiepper é autor de duas ideias legislativas que conseguiram os votos necessários e estão em tramitação no Senado: a primeira (SUG nº 8/2014) pretende regular o uso recreativo, medicinal e industrial da maconha; e a segunda (SUG nº 15/2014) para regulamentar o aborto até a 12ª semana de gestação pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

Foram realizadas onze audiências públicas para debater as duas matérias. O senador Cristovam Buarque, relator da SUG nº 8, recomendou a criação de uma subcomissão especial na CDH para debater o tema. Já o relator da proposta para regular a interrupção voluntária da gravidez, senador Magno Malta, ainda não apresentou parecer.

André é bastante ativo no Portal e-Cidadania desde 2013, quando conheceu o programa em uma pesquisa para o seu mestrado sobre a política de drogas na Escola Nacional de Saúde Pública. Em 2014, conseguiu que o Senado realizasse duas audiências públicas sobre a descriminalização do porte de drogas e sobre uso medicinal da maconha.

Outras duas ideias de André ainda estão abertas para votação no e-Cidadania. Uma delas, quer transformar as propostas que alcancem mais de 100 mil apoios automaticamente em plebiscitos.

“Eu sou militante de uma reforma maior, política, que a gente consiga participar de forma mais direta”, argumenta. “Mark Zuckerberg, do Facebook, sonha que no futuro as pessoas irão votar pela internet e isso vai acabar se tornando realidade quanto tivermos formas de certificar os votos”.

Por Ohanna Patiele

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