Opinião: O novo capítulo de um velho conflito

João Alfredo Lopes Nyegray*


Na manhã de sábado, dia 7 de outubro, combatentes do Hamas lançaram um ataque sem precedentes contra Israel. Nas primeiras horas do conflito, mais de 5 mil foguetes e bombas haviam sido lançados contra alvos israelenses,resultando na morte e captura de dezenas de civis. Esse movimento inédito em termos de força, armamento e coordenação já deixou marcas profundas no Oriente Médio e na geopolítica. 

O Hamas é um grupo político e militar palestino que surgiu na década de 1980. Seu nome é uma abreviação de "Movimento de Resistência Islâmica" em árabe (Harakat al-Muqawama al-Islamiya). O grupo foi criado durante a Primeira Intifada, um levante palestino contra a ocupação israelense nos territórios palestinos. O Hamas tem uma natureza complexa, pois atua tanto como organização política como grupo armado.

Uma de suas principais características é a resistência armada contra Israel, utilizando táticas como atentados suicidas, lançamento de foguetes e confrontos militares. Ao mesmo tempo, o Hamas também participa de eleições políticas. Em 2006, o grupo venceu as eleições legislativas na Faixa de Gaza – o que levou a uma divisão entre o Hamas e a Autoridade Palestina, liderada pela Fatah. Isso resultou em conflitos internos e na tomada de controle do Hamas na Faixa de Gaza em 2007. Desde então, Israel considera o Hamas uma organização terrorista, enquanto alguns países e analistas destacam a complexidade da situação, argumentando que o grupo tem uma base popular significativa na região.

No sábado, dia 7 de outubro, exatamente 50 anos e um dia após a guerra do Yom Kippur – em que uma coalizão de países árabes liderados por Egito e Síria invadiu Israel. Nesse episódio, combatentes do Hamas invadiram dezenas de lugares em Israel, desencadeando o ataque mais grave da última geração. Civis foram alvejados e feitos reféns. Horas depois, Israel respondeu com ataques aéreos em várias regiões da Faixa de Gaza. 

Ainda que esse ataque seja sem precedentes, o conflito entre israelenses e palestinos pela região é bastante antigo, remontando ao final do século XIX e início do século XX. Nesse período, houve um aumento do movimento sionista, que buscava estabelecer um lar nacional judeu na Palestina, então parte do Império Otomano. A Declaração de Balfour, emitida pelo Reino Unido durante a Primeira Guerra Mundial em 1917, expressou o apoio britânico à criação de um "lar nacional para o povo judeu" na Palestina.

Após a Segunda Guerra Mundial e o Holocausto, o movimento sionista ganhou mais força, e, em 1947,  a ONU propôs a partilha da Palestina em um estado judeu e um estado árabe . A criação do Estado de Israel em 1948 provocou uma guerra entre os estados árabes e Israel. Israel emergiu vitorioso e ampliou seu território, enquanto muitos palestinos se tornaram refugiados. Desde então, houve vários conflitos na região, incluindo guerras, intifadas e confrontos, alimentando a contínua disputa pelo território.

O que estamos testemunhando agora é um capítulo sem precedentes desse conflito antigo: o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, lançou a operação “Espadas de Ferro”, declarando guerra em resposta imediata à incursão do Hamas. Até o momento, mais de 300 mil reservistas israelenses foram convocados – o que também é inédito. Em resposta aos mais de 700 israelenses mortos, o governo de Israel pediu que os moradores da Faixa de Gaza deixem suas casas. Embora a geografia da região seja um complicador, não se descarta uma ação militar israelense em terra na Faixa de Gaza. Os serviços de água, telefonia e energia estão suspensos na região, assim como o envio de alimentos e combustíveis. 

No início desta semana, os mercados repercutem os assustadores ataques de sábado e a incerteza geopolítica do momento. O preço do petróleo está em alta, assim como a volatilidade do mercado energético. Em um momento de inflação elevada, projeta-se um aumento ainda maior nos preços em geral – especialmente em virtude de um possível aumento duradouro no preço do petróleo. 

Outro questionamento frequente após o ataque de sábado é sobre a preparação e o armamento do Hamas. Quem teria armado o grupo e auxiliado na coordenação das ações militares? Enquanto muitos analistas apontam para o Irã, o regime de Teerã nega qualquer envolvimento. Os serviços de inteligência e segurança de Israel também afirmam ainda que há militantes do Hamas infiltrados em seu território, o que indica que a luta continuará nas próximas semanas. 

Certamente, a resposta israelense será bastante forte, aumentando não apenas a tensão no Oriente Médio, mas também as incertezas geopolíticas globais. Deve-se ressaltar que qualquer esforço de guerra continuado por parte de Israel terá impactos até mesmo em Kiev. Afinal, o fornecimento ocidental de armas, que até o momento vinha servindo à Ucrânia, seria dividido com Tel-Aviv.  

*João Alfredo Lopes Nyegray é doutor e mestre em Internacionalização e Estratégia. Especialista em Negócios Internacionais. Advogado, graduado em Relações Internacionais. Coordenador do curso de Comércio Exterior e do Observatório Global da Universidade Positivo (UP). Instagram: @janyegray

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